Jeff CarrollRachel HardingEscrito por Dr Jeff Carroll e Dr Rachel Harding Editado por Professor Ed Wild Traduzido por Filipa Júlio

As famílias de todo o mundo estão a sentir o impacto da COVID-19, mas há esperança no horizonte - e tem a forma de novas vacinas revolucionárias que foram desenvolvidas em tempo recorde. Como é que o coronavírus está a ter impacto nas famílias com DH e será que devem estar preocupadas com alguma das vacinas que está no mercado? Será que os doentes de Huntington devem ser vacinados? Vamos explicar isto a seguir, mas a resposta rápida é - sim, absolutamente!

DH e doenças infecciosas

Conseguir ultrapasssar os desafios da vida diária pode parecer uma maratona para as famílias com doença de Huntington. O stress provocado pelo coronavírus tornou as coisas ainda mais duras. Os doentes de Huntington debatem-se muitas vezes com sentimentos de isolamento, e esta constante entrada e saída em situações de confinamento só aumenta estes sentimentos de solidão. O acesso regular aos cuidados de saúde para lidar com questões relacionadas com a DH é também muito mais desafiante, numa altura em que os consultórios dos médicos e os hospitais podem parecer muito ameaçadores e assustadores.

O Prof. Ed Wild tem tido o seu tempo livre ocupado com a vacinação de pessoas contra a COVID-19
O Prof. Ed Wild tem tido o seu tempo livre ocupado com a vacinação de pessoas contra a COVID-19

Numa série de avanços incríveis, os cientistas dedicados às doenças infecciosas conseguiram desenvolver um conjunto de vacinas altamente eficazes contra o coronavírus em tempo recorde. Neste início de 2021, temos várias vacinas já aprovadas pelos reguladores, e várias outras a caminho disso.

Com boas razões para tal, as famílias com DH sentem-se nervosas com tudo o que possa ter um impacto no bem-estar dos seus entes queridos afectados pela DH. Então, será que as famílias devem encorajar os seus elementos com doença de Huntington a serem vacinados? Vamos abordar a seguir algumas das preocupações que o HDBuzz ouviu da comunidade Huntington acerca do coronavírus e das vacinas, mas se só quiser a resposta mais rápida - temos uma forte opinião de que todas as pessoas que sejam elegíveis para receberem a vacina o devem fazer, incluindo os doentes de Huntington.

ARNm parece assustador?

Uma das preocupações referidas pela comunidade é o facto de várias das novas vacinas - testadas e vendidas pela Pfizer/BioNTech e pela Moderna - dependerem de uma tecnologia inovadora designada como ácido ribonucleico mensageiro (ou ARNm). No HDBuzz falamos frequentemente sobre o ARN mensageiro no contexto dos ensaios clínicos de redução da Huntingtina, como aqueles que utilizam ASOs, acerca dos quais já muito falámos aqui e aqui. Estas terapias têm como alvo de destruição um ARNm específico nas nossas células - aquele que lhes diz como produzir a proteína Huntingtina.

Se terapias como os ASOs têm como alvo o ARNm para tentar curar a DH, e se estas vacinas contêm ARNm, devemos estar preocupados? Não! O ARN mensageiro é um dos tipos de componentes mais comuns das nossas células, sendo que cada uma contém literalmente dezenas de milhar - se não centenas de milhar - de tipos diferentes de ARNm. Os ARNm são abundantes em todos os seres vivos, sendo que estamos constantemente a ingerir ARNm de forma segura quando comemos frutas, vegetais ou outros alimentos, em níveis muito mais elevados do que aqueles que se encontram nas vacinas com ARNm.

Se as nossas células contêm uma vasta biblioteca de ARNm, os fármacos redutores da Huntingtina em relação aos quais estamos esperançosos funcionam como se nos infiltrássemos nessa biblioteca, tirássemos um livro da prateleira e o rasgássemos. As novas vacinas que se baseiam em tecnologia ARNm funcionam como se infiltrássemos um novo livro na biblioteca - um livro que ensina às nossas células como reconhecer o coronavírus - e o colocássemos discretamente na prateleira.

Como é que ensaios rápidos podem avaliar correctamente novas vacinas?

Mas e quanto ao facto destas vacinas terem sido testadas tão rapidamente, isso não significa que não foram testadas tão rigorosamente como outros fármacos? Felizmente, a resposta a esta pergunta é um claro não. O desenvolvimento inicial das vacinas contra o coronavírus aconteceu de facto muito rapidamente, mas isto porque se estava a construir sobre uma base enorme de trabalho já existente em vacinas ARNm, preparada por muitos anos de dedicação de cientistas de todo o mundo que estavam a produzir vacinas ARNm para outras doenças e que poderiam então aplicar a sua tecnologia para ajudar a combater a pandemia.

Todas as vacinas disponíveis foram cuidadosamente testadas e demonstrou-se que obedecem a critérios de segurança muito rigorosos determinados por diferentes agências do medicamento independentes, tal como a Food and Drug Administration (FDA) e a Agência Europeia do Medicamento (EMA). É verdade que isto aconteceu mais rápido do que é normal, mas as coisas onde se atalhou para acelerar o processo foram fundamentalmente aspectos burocráticos e não científicos. Como havia uma necessidade tão urgente da vacina, todos os intervenientes envolvidos no processo de produção, testagem e avaliação das vacinas trabalharam em estreita colaboração e removeram os bloqueios administrativos que muitas vezes atrasam a aprovação de novos fármacos.

A realidade sobre a DH e infecções

A DH é uma doença exigente para as famílias e as complicações acrescidas de lidar com a infecção por COVID podem realmente aumentar as lutas diárias que uma pessoa com DH ou o seu prestador de cuidados enfrentam. Embora as pessoas com DH não tenham um risco mais elevado de contrair COVID, ter COVID é definitivamente de se evitar o mais possível.

Ainda sabemos muito pouco sobre se as pessoas com DH são afectadas pela infecção por COVID mais do que outros grupos, mas os dados relativos à população em geral mostram que a COVID pode ter efeitos devastadores em pessoas que, de outro modo, estariam saudáveis. É importante que todos façamos o nosso melhor para parar a propagação desta doença, seguindo os conselhos de saúde pública para ficar em casa o máximo de tempo possível, lavar as mãos, seguir as regras de distanciamento social e utilizar máscaras de protecção - tudo coisas com as quais provavelmente estamos já muito familiarizados um ano depois do início da pandemia.

As vacinas ARNm contra a COVID-19 dão intruções aos nossos corpos para produzirem um fragmento inofensivo da proteína espinhosa da COVID-19 que se encontra à superfície do vírus. Quando o nosso sistema imunitário encontra a proteína espinhosa, os nossos corpos irão desenvolver uma resposta imunitária contra esta proteína. Isso significa que, se estivermos infectados com COVID, seremos capazes de lutar contra ele.  Imagem feita com Biorender
As vacinas ARNm contra a COVID-19 dão intruções aos nossos corpos para produzirem um fragmento inofensivo da proteína espinhosa da COVID-19 que se encontra à superfície do vírus. Quando o nosso sistema imunitário encontra a proteína espinhosa, os nossos corpos irão desenvolver uma resposta imunitária contra esta proteína. Isso significa que, se estivermos infectados com COVID, seremos capazes de lutar contra ele. Imagem feita com Biorender

As vacinas são outro ponto importante para travarmos o avanço das infecções por COVID. As vacinas destinadas à COVID demonstraram ser das vacinas mais eficazes que os cientistas conseguiram fazer até à data, com uma eficácia superior a 90% nalguns casos! Não há dados que sugiram que os doentes de Huntington especificamente não devam receber a vacina, a qual foi testada num grupo muito variado de pessoas e que já foi administrada a vastas faixas da população em países como os EUA ou Israel. Até agora, os grupos que estão a ser aconselhados a não receberem a vacina são pessoas imunocomprometidas e pessoas que têm alergia aos ingredientes das vacinas. Isto significa que a maior parte das pessoas com DH tem luz verde para seguir em frente e ser vacinada.

O que dizem os médicos?

Falámos com alguns médicos especialistas em DH para saber o que pensam acerca das vacinas para a COVID.

“Somos tremendamente afortunados por viver numa época em que as ciências médicas avançaram ao ponto de termos vacinas menos de um ano depois do início da pandemia. Eu e os meus colegas do Centro de Cardiff dedicado à DH já fomos vacinados e fico muito feliz por ver que a comunidade Huntington local está a começar a ser vacinada. A COVID-19 é uma condição desagradável e, especialmente tendo em consideração o que já sabemos sobre o seu impacto no cérebro de algumas pessoas, é claro que ser vacinado é muito mais seguro do que contrair a COVID-19. ” - Professor Anne Rosser PhD FRCP

“Ser vacinado é receber um super-poder - a capacidade de derrotar um inimigo que ainda nem sequer se conheceu. Eu fui voluntário no ensaio clínico da vacina da AstraZeneca e tenho passado todo o meu tempo livre desde a noite de Natal a vacinar as pessoas de Londres. A escolha a considerar não é entre a vacina e nada, é entre a vacina e a COVID, que é a maior ameaça que a comunidade Huntington enfrenta actualmente. As vacinas são seguras, incrivelmente eficazes, e não constituem nenhum risco especial para as pessoas que têm agora DH ou que virão a ter DH. Temos que fazer tudo o que estiver ao nosso alcance para que os elementos das famílias Huntington fiquem protegidos e seguros em relação à COVID, para que possamos voltar a combater a DH juntos.” - Professor Edward Wild MA MB BChir FRCP PhD

“Os doentes e as suas famílias perguntam-nos sobre a COVID-19 e a doença de Huntington. Estamos a aprender cada vez mais sobre a pandemia e sobre as vacinas que previnem a infecção. Há muita coisa que sabemos e há muita coisa que não sabemos. A COVID-19 é potencialmente uma condição fatal. Há factores de risco que a tornam mais perigosa, incluindo doentes mais velhos e pessoas que têm outros problemas médicos. Os doentes de Huntington têm mais probabilidade de adoecer com COVID-19 se forem infectados. Não temos dados específicos sobre isto, mas a maioria dos médicos concorda que os doentes de Huntington deverão fazer tudo o que puderem para prevenirem a infecção. Encorajo todos os meus doentes a receberem vacinas aprovadas quando estas estão disponíveis. Há alguns riscos em relação às vacinas, mas são mínimos quando comparados com ter a infecção. Não há qualquer indicação de que tomar medicamentos para o tratamento da DH torne a pessoa mais susceptível à infecção ou torne a sua condição pior. Não há também qualquer indicação de que os fármacos investigacionais que estão a ser actualmente testados para a DH, seja para melhoria dos sintomas, seja para redução da velocidade de progressão da doença, façam com que os doentes de Huntington fiquem piores ou aumentem o risco de contrair a COVID-19. Resumindo, fazendo o balanço entre riscos e benefícios, seja vacinado o mais rapidamente possível.” - Mark Guttman MD FRCPC

“A ciência que suporta as vacinas para a COVID que foram aprovadas é convincente. São seguras e eficazes e, apesar de não terem sido testadas especificamente na população com DH, eu encorajaria as pessoas das famílias Huntington a considerarem ser vacinadas se isso lhes for proposto.” - Professor Victor Sung MD

A mensagem principal

A ciência demonstra claramente que as vacinas para a COVID são seguras, eficazes e a nossa melhor hipótese de combater esta pandemia.

Os autores não têm qualquer conflito de interesses a declarar. Para mais informações sobre a nossa política de divulgação, veja a nossa FAQ...



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