Escrito por Dr Tony Hannan Editado por Professor Ed Wild Traduzido por Filipa Júlio

Sabemos que o exercício atrasa a progressão de sintomas nos ratinhos com DH, mas não sabemos porquê. Novas investigações mostraram que o exercício impulsiona o processo de reciclagem celular nos músculos dos ratinhos. Esta descoberta pode aumentar o nosso conhecimento sobre a DH e ajudar a desenvolver novos fármacos.

Natureza e Educação

Todas as doenças resultam da “natureza e educação” - muitas vezes combinações complexas de factores genéticos e ambientais. Quando se descobriu, há mais de uma dúzia de anos, que mesmo uma doença hereditária como a doença de Huntington podia ser retardada em ratinhos, através do aumento do exercício mental e físico, isto teve enormes implicações no modo como compreendemos estas doenças.

Parece que o exercício aumenta a actividade da maquinaria de reciclagem das células - pelo menos, em ratinhos
Parece que o exercício aumenta a actividade da maquinaria de reciclagem das células - pelo menos, em ratinhos

Até essa altura, a DH foi considerada como um caso de “determinismo” genético. Estas descobertas em ratinhos, mais tarde apoiadas em estudos com famílias Huntington, demonstraram que os factores ambientais podem também ter papeis importantes nas doenças genéticas, o que sugere novas abordagens para adiar o início e possivelmente atrasar a progressão da DH.

Porque é que o exercício é benéfico?

Uma das questões-chave nos primeiros estudos com ratinhos foi a promoção do exercício físico. Há muito tempo que sabemos que o aumento de exercício é bom para o corpo, mas há novas provas que sugerem que é também bom para o cérebro e é protector em relação a determinadas doenças neurológicas e psiquiátricas. Um aspecto essencial destas descobertas é o de perceber como é que o exercício beneficia o corpo e o cérebro. Se o conseguirmos descobrir, talvez consigamos usá-lo para desenvolver novas terapias para prevenir e atrasar a doença.

O aumento do exercício físico demonstrou ser positivo para uma série de doenças diferentes, incluindo doenças metabólicas como a Diabetes. Em relação ao cérebro, há diversas doenças que se demonstrou beneficiarem do aumento de exercício, incluindo a doença de Alzheimer e outras formas de demência. Contudo, ainda não percebemos completamente como é que o exercício exerce os seus efeitos benéficos no cérebro e no corpo.

Autofagia

Um trabalho recente feito por uma equipa de investigadores da “University of Texas”, dirigidos pela Dra Beth Levine, abordou o modo como o exercício pode afectar o corpo.

A principal descoberta que fizeram foi a de que o exercício pode afectar um processo dentro das células designado como “autofagia”. A Autofagia é como um armazém de reciclagem dentro das células que assegura que as moléculas que não estão a trabalhar correctamente são removidas do sistema e substituídas por outras que de facto trabalham.

Para percebermos este processo essencial que ocorre dentro das células, temos que analisar brevemente a complexidade maravilhosa das moléculas que residem em cada célula dentro do nosso corpo. Cada célula contém uma cópia dos 3 biliões de “letras” do nosso genoma. Estas letras formam mais de 20 000 genes, cada um dizendo à célula como fazer proteínas.

«O aumento de exercício nos ratinhos normais aumenta a autofagia nas células musculares »

Cada célula pode conter dezenas de milhares de proteínas diferentes, cada qual com estruturas e funções únicas. As células têm maquinaria que destrói e recicla proteínas velhas ou com malformações, para ajudar a manter as células saudáveis. A autofagia é uma aspecto essencial deste processo de reciclagem celular.

Autofagia na DH

Sabe-se que a autofagia está disfuncional num certo número de doenças neurológicas, incluindo a doença de Huntington. Mais ainda, dados recentes sugerem que aumentar artificialmente a autofagia, por exemplo usando uma substância específica, pode ser útil em modelos de DH, provavelmente devido a uma remoção mais eficaz dos fragmentos de proteína tóxica.

Por isso, tudo o que altere a autofagia é do interesse dos investigadores da DH.

Uma ligação entre exercício e autofagia

As novas descobertas de Levine, publicadas na revista “Nature”, mostram que o aumento do exercício em ratinhos normais promove a autofagia nas células musculares dos membros e do coração. Conseguiram, também, identificar as moléculas-chave envolvidas neste fenómeno dentro das células. Quando interromperam estes mecanismos moleculares, os ratinhos não foram capazes de colher os efeitos benéficos do aumento de exercício.

Alimentar os ratinhos com uma dieta rica em gorduras pode provocar alterações metabólicas na forma como o açúcar é processado. O exercício pode ajudar a combater esses problemas induzidos pela dieta, e a equipa de Levine demonstrou que o aumento da autofagia estava envolvido neste aspecto benéfico do exercício.

Ratinhos geneticamente modificados, que não foram capazes de ter este aumento benéfico da autofagia, exibiram igualmente pouca resistência ao exercício, demonstrando que a relação entre exercício e reciclagem molecular é profunda e parece ser feita nas duas direcções.

Ainda está por saber se o exercício tem os mesmos efeitos benéficos nos humanos - e na DH.  Mas esta investigação apoia a ideia de que as pessoas afectadas pela DH devem permanecer tão activas quanto possível.
Ainda está por saber se o exercício tem os mesmos efeitos benéficos nos humanos - e na DH. Mas esta investigação apoia a ideia de que as pessoas afectadas pela DH devem permanecer tão activas quanto possível.

O que significa isto para a DH?

Estes resultados são sobretudo relevantes para doenças metabólicas como a Diabetes. Contudo, este estudo poderá ser igualmente relevante para doenças do cérebro. Portanto, qual poderá ser a mensagem-chave para a investigação na DH?

Sabemos que o aumento da actividade física pode ter efeitos benéficos para os animais com DH. Isto poderá acontecer através de diferentes processos, incluindo ter efeitos directos no cérebro, músculos, sangue, sistema imunitário e noutros orgãos.

Uma das implicações dos estudos anteriores é a de que se compreendermos como é que o aumento da estimulação cognitiva e do exercício físico provocam efeitos benéficos, ao nível das moléculas e das células poderemos chegar às substâncias “enviro-mimetics” - substâncias que mimetizam ou aumentam os efeitos benéficos da estimulação ambiental.

As substâncias “enviro-mimetics” podem providenciar o tão necessário impulso às células, orgãos, corpos e cérebros.

É de realçar que este novo artigo sobre autofagia dá um novo insight acerca dos efeitos do exercício dentro das células, pelo menos em relação aos músculos. Dá-nos igualmente novas informações para o nosso conhecimento acerca dos factores que podem regular a autofagia, ou reciclagem molecular, dentro das células.

Estas novas descobertas básicas necessitam de ser testadas em animais com a mutação Huntington antes que possamos tirar conclusões em relação à doença de Huntington. Mas, se forem verdadeiras, podem ajudar a identificar moléculas-chave que podem funcionar como alvos de novos medicamentos - medicamentos que poderão ser úteis para uma série de doenças, incluindo a DH.

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