Jeff CarrollEscrito por Dr Jeff Carroll Editado por Professor Ed Wild Traduzido por Filipa Júlio

O nosso segundo relatório diário do Congresso Mundial sobre Doença de Huntington no Rio de Janeiro, Brasil.

08:06 - Bom dia a partir do Rio, para o segundo dia do Congresso Mundial sobre Doença de Huntington

08:07 - Começamos o dia com uma sessão sobre “biomarcadores” - coisas que podemos medir nas pessoas e que nos poderão ajudar a desenvolver e a testar fármacos.

Roberto Weiser põe-nos a par da situação na Venezuela, onde a DH é invulgarmente comum
Roberto Weiser põe-nos a par da situação na Venezuela, onde a DH é invulgarmente comum

08:08 - Alexandra Durr, do “Institut Marie Curie”, de Paris, inicia a sessão com uma comunicação sobre o TRACK-HD.

08:08 - O TRACK-HD foi dirigido pela Prof. Sarah Tabrizi, em Londres. A Prof. Durr dirige o centro de Paris e tem um interesse especial pelas alterações metabólicas. O TRACK-HD terminou este ano e produziu um conjunto de medidas que podemos utilizar para desenvolver ensaios clínicos.

08:11 - Durr: a DH tem uma longa fase pré-sintomática antes dos sintomas começarem e as pessoas podem fazer um teste para identificar se estão em risco. Isto permite-nos estudar e compreender os estadios precoces da doença e dá-nos a oportunidade de intervir precocemente para prevenir o início da doença. Esta é uma grande vantagem em relação a outras doenças neurodegenerativas, em que o diagnóstico precoce não é possível. A fase pré-manifesta acarreta, também, desafios. É muito difícil detectar as coisas que são diferentes na DH pré-manifesta.

08:14 - Durr: O TRACK-HD decorreu em 4 centros - Londres, Paris, Leiden (Holanda) e Vancouver. O TRACK-HD foi desenvolvido como um ensaio clínico sem um fármaco - a ênfase foi colocada na recolha dos melhores dados possíveis e na consistência entre os centros. Foi utilizada Ressonância Magnética (MRI) para medir a atrofia ou redução cerebral. O cérebro de todos nós está constantemente a encolher! Na DH isso acontece um pouco mais depressa. A qualidade dos dados imagiológicos do TRACK-HD permite várias análises detalhadas, revelando novos aspectos da DH. O conjunto de medidas do TRACK-HD permite-nos calcular quantas pessoas precisaremos para cada um dos ensaios clínicos que estão planeados.

08:28 - Durr: Apesar das alterações cerebrais detectáveis, as pessoas com DH pré-manifesta continuam a funcionar normalmente. O cérebro é bom a compensar. O TRACK-HD diz-nos que há muito a SALVAR no cérebro com DH. O estudo TrackOn-HD foca-se na descoberta destes mecanismos compensatórios, para que possamos aumentá-los. Estão agora a ser planeados vários ensaios clínicos que estão a utilizar no seu desenho as descobertas feitas pelo TRACK-HD.

08:48 - A seguir, Karl Kieburtz (da “University of Rochester”) faz uma reflexão acerca daquilo que estudos como o TRACK-HD ou o PREDICT-HD fizeram para ajudar os ensaios clínicos. Os fármacos são aprovados para tratar doenças, não a atrofia cerebral ou outros biomarcadores. O PREDICT-HD envolveu um grande número de portadores pré-sintomáticos da mutação da DH, de 32 centros diferentes. Quais são as diferenças entre o TRACK-HD e o PREDICT-HD? O TRACK-HD teve um conjunto de critérios de participação mais alargado, incluindo pessoas com DH sintomática. Ambos os estudos encontraram medidas de alteração fiáveis ao longo do espectro da DH. Ambos os estudos concluíram que as técnicas de imagiologia cerebral são formas poderosas de medir a progressão da DH. Testes cognitivos (de raciocínio) simples são também boas medidas para avaliar a progressão.

09:01 - Kieburtz: então… como é que estes estudos nos podem ajudar a ter novos fármacos para serem testados e aprovados para a DH? As agências reguladoras, como a FDA, são muito cautelosas e têm critérios muito rígidos para aprovarem fármacos para uso em humanos. A FDA indicou recentemente que está disposta a flexibilizar os critérios para a doença de Alzheimer. A FDA parece estar agora disposta a ter em consideração os biomarcadores no processo de decisão sobre a aprovação de fármacos para fases muito precoces de doenças neurológicas . Nos EUA, só há um fármaco (tetrabenazina / Xenazine) que está licenciado especificamente para o tratamento da coreia causada pela DH.

09:41 - Ralf Reilmann - os clínicos que trabalham na DH precisam de dar aos investigadores das ciências básicas boas medidas para que eles as possam utilizar nos ensaios clínicos.

09:43 - Reilmann: Será que as alterações observadas nos cérebros dos portadores da mutação da DH são úteis como medidas de resultados para os ensaios clínicos? Reilmann é um especialista em doenças do movimento e defende que as alterações de movimento são uma medida muito boa da progressão da DH. Os métodos utilizados para medir as alterações de movimento nos doentes de Huntington não funcionam muito bem em portadores da mutação da DH que ainda não estão doentes. Reilmann constrói máquinas personalizadas que são utilizadas para medir alterações de movimento muito mais subtis nos portadores da mutação da DH. As alterações de movimento muito subtis podem ser detectadas nos portadores da mutação da DH até 10 a 20 anos antes destes adoecerem. Algumas das máquinas de Reilmann requerem que as pessoas empurrem uma alavanca com a língua, tentando manter uma pressão constante. Os doentes de Huntington têm problemas em deitar a língua de fora e mantê-la firme - algo que foi notado pelo Dr. Huntington em 1872. Reilmann acredita que algumas das alterações de movimento que foram descritas podem ser usadas como medidas em ensaios de fármacos para a DH. Reilmann acredita que estas alterações de movimento precoces nos portadores da mutação não implicam que as pessoas com estas alterações sejam “doentes”. O grupo de Reilmann experimentou os seus novos testes motores num ensaio com doentes de Huntington e as tarefas funcionaram bem, com “efeitos placebo” reduzidos.

10:04 - Julie Stout, da “Monash University”, estuda como é que a capacidade de raciocínio, ou “cognição”, dos portadores da mutação da DH se altera ao longo da vida. Os tipos de problemas de cognição variam de doente de Huntington para doente de Huntington. Actualmente, Stout trabalha na comparação de diferentes tipos de questionários e de testes para medir as dificuldades cognitivas das pessoas. Mesmo os portadores da mutação da DH que ainda não estão doentes apresentam alterações subtis na cognição - embora as alterações medidas sejam muito pequenas. As alterações cognitivas encontradas nos portadores da mutação da DH são lentas e subtis ao longo do tempo. Há testes específicos que são bastante bons para predizer quando é que as pessoas irão apresentar sintomas de DH, incluindo uma tarefa simples denominada “circle-tracing” (traçar círculos). Stout e outros notaram que alterações no formato do cérebro ocorrem muito antes de existirem sinais de alterações de raciocínio ou de movimento na DH. O cérebro tem uma capacidade surpreendente para lidar com os danos causados pela DH, mostrando um funcionamento normal ainda durante muito tempo antes de se tornar disfuncional. As imagens de ressonância magnética sugerem que os portadores da mutação da DH poderão estar a utilizar os seus cérebros de forma diferente para resolver tarefas complexas. Há alguns dados que sugerem que ter um estilo de vida mais “passivo” poderá estar associado a sintomas de DH mais precoces - todos nós nos devemos manter activos! Stout mostra dados que sugerem que o stress pode ser mau para o desempenho de memória dos doentes de Huntington. Stout sumariza esta ideia, sugerindo que há fortes provas de que os problemas cognitivos na DH são passíveis de ser modificados pelo ambiente.

10:33 - Rachael Scahill, do “UCL”, utiliza equipamentos de ressonância magnética muito potentes para estudar as alterações no formato do cérebro dos portadores da mutação da DH.

10:36 - Scahill: as alterações no formato do cérebro só são de facto importantes se causarem sintomas nos portadores da mutação da DH. Dados do estudo TRACK-HD sugerem que ter uma redução mais rápida do volume cerebral está associado a ter uma maior probabilidade de progredir para uma condição de DH manifesta. A boa notícia sobre todas estas alterações cerebrais é a de que possivelmente as poderemos utilizar em ensaios, quando estivermos a analisar os benefícios depois do tratamento. Temos que utilizar tanto a imagiologia cerebral, como as medidas do funcionamento da pessoa, para ter uma boa perspectiva da progressão da DH.

Uma característica excelente deste Congresso Mundial sobre DH é a de que a maioria dos cientistas está a fazer duas apresentações - uma para os especialistas e outra para as famílias. Nós apoiamos absolutamente a ideia dos cientistas comunicarem directamente e claramente com as pessoas que são directamente afectadas pelas suas investigações!

12:37 - Anna Wickenberg, da “Teva pharmaceuticals”, está a descrever os esforços desta companhia farmacêutica na DH. A Teva tem dois fármacos em desenvolvimento para tratar a DH, o primeiro tentará reduzir a “inflamação” no cérebro. As células imunitárias, incluindo as células imunitárias no cérebro, são hiperactivas na DH. Acalmá-las talvez possa ajudar? A Teva tem um fármaco, “Laquinimod”, que acalma as células imunitárias cerebrais. Eles estão interessados em testar isto na DH para ver se será benéfico. O outro fármaco da Teva é a “Pridopidina”, anteriormente designada “ACR-16”. Este fármaco foi testado pela companhia farmacêutica Neurosearch e agora a Teva comprou-o. A Pridopidina foi testada em dois ensaios com doentes de Huntington - chamados MermaiDH (na Europa) e HART (nos EUA e Canadá). A Pridopidina teve resultados benéficos nos sintomas motores da DH, especialmente nas doses mais elevadas, mas os ensaios não foram suficientemente convincentes.

12:49 - A Teva e os seus colaboradores estão a planear um novo ensaio em doentes de Huntington em 2014, com resultados a publicar em 2015, para tentarem encontrar a dose certa. Este novo ensaio vai focar-se num conjunto alargado de testes motores, para ver se doses mais elevadas de Pridopidina podem ajudar. Para o caso de estar confuso - a Pridopidina também é denominada “Huntexil”!

13:00 - Bernhard Landwehrmeyer faz a pergunta - quando se testam fármacos na DH, preocupamo-nos com o facto das pessoas parecerem melhor ou com o facto de funcionarem melhor? As agências que aprovam os medicamentos sugeriram métodos para descobrir medidas significativas da melhoria dos sintomas nos doentes de Huntington.

13:04 - Landwehrmeyer: Encontrar boas medidas para avaliar os sintomas da DH é difícil, porque estes sintomas alteram-se ao longo do curso da doença. Garantir que um tratamento é benéfico para as vidas dos doentes é um desafio difícil, mas que vale a pena.

A assistência reúne-se para o Buzzilia: os vídeos estarão disponíveis em hdbuzz.net depois da conferência
A assistência reúne-se para o Buzzilia: os vídeos estarão disponíveis em hdbuzz.net depois da conferência

13:09 - Ralf Reilmann abriu o “George Huntington Institute”, na Alemanha http://george-huntington-institut.de/

13:10 - Reilmann faz a pergunta - somos capazes de recrutar números suficientes de doentes de Huntington para os ensaios clínicos vindouros? Mais de 12 000 pessoas, em 18 países da Europa, estão a participar no estudo REGISTRY, o que sugere que os doentes querem estar envolvidos. Um estudo observacional da DH, chamado Enroll, já tem mais de 1000 doentes nas Américas, Austrália e Nova Zelândia.

13:14 - Reilmann: Tanto o “Huntington Study Group”, como a “European HD Network”, desenvolveram bons ensaios clínicos na DH - o que prova que isso é possível. Baseado na sua experiência em ensaios de fármacos para a DH, Reilmann acredita que é possível fazer um recrutamento rápido de participantes para ensaios futuros.

14:01 - Landwehrmeyer abre a sessão da tarde sobre o que ele diz ser uma das capacidades mais importantes das pessoas afectadas pela DH - o “coping” (lidar com os problemas). Aam Hubers, de Leiden, está a estudar o fenómeno do suicídio na DH - o que sabemos sobre isso? Os estudos publicados sugerem que o suicídio é entre 2 a 8 vezes mais comum na DH do que na população geral. Os pensamentos relacionados com suicídio dos doentes de Huntington parecem ocorrer numa fase em que estão a perder a independência e a ficar mais dependentes dos cuidados de terceiros. Como a informação existente era escassa, Hubers propôs-se a estudar um grande número de doentes de Huntington ao longo do tempo para compreender o suicídio na DH. Hubers questiona - que factores levam a que os portadores da mutação da DH pensem sobre ou tentem o suicídio? Cerca de 20% dos portadores da mutação da DH estudados por Hubers, tendo ou não sintomas de DH, pensaram em suicídio no último mês. Os estudos que Hubers está a desenvolver sugerem que os doentes de Huntington que referem estar deprimidos parecem ter um maior risco de suicídio. Hubers recomenda que os doentes de Huntington com depressão devem ser cuidadosamente vigiados em relação a pensamentos sobre suicídio, baseado nesse risco acrescido.

14:26 - Ken Serbin - que assina um blog como ‘Gene Veritas’ - fala sobre “coping” (lidar com os problemas) no Congresso Mundial sobre Doença de Huntington. O seu blog sobre DH pode ser visto aqui - http://curehd.blogspot.com

14:27 - Serbin tem ligações profundas ao Brasil, já que estuda a história do Brasil na sua profissão. Serbin partilha as lutas da sua família com a DH, dado que só descobriu a doença quando a sua mãe começou a apresentar sinais. Serbin partilha com a audiência as suas estratégias de coping para viver numa família com DH. A primeira estratégia da lista de Serbin é educar-se, saber mais acerca da doença, estratégia a que ele chama a “base para a defesa e esperança”. Serbin descreve as formas como ele lida activamente com a DH, fazendo exercício físico, comendo bem e tomando suplementos, na esperança de que estes ajudem. Serbin sente que escrever no seu blog tem sido uma enorme ajuda para conseguir lidar emocionalmente com o facto de viver numa família Huntington. Serbin diz às famílias Huntington: É tempo de serem um porta-voz, contem as vossas histórias!

14:51 - Serbin: “Enquanto portadores do gene da DH, estamos a viver numa nova era de esperança”.

14:58 - Chales Sabine dirige-se à audiência da Conferência. Podem ler acerca da sua luta com a DH aqui - http://moreintelligentlife.com/content/laura-spinney/health-different-battle

15:02 - Foi dito a Sabine, depois de testar positivo para a DH: “Não há nada que possas fazer acerca desta doença, vive apenas a tua vida o melhor que conseguires”. Sabine mostrou que isto estava completamente errado, desde que se envolveu activamente na luta contra a DH.

15:04 - Sabine: parte das trevas da DH tem que ver com o sentimento de isolamento experienciado pelas famílias Huntington. Os meios de comunicação social permitem que os jovens de famílias Huntington possam relacionar-se, ajudando a combater esta sensação de isolamento. “Ninguém virá com uma varinha mágica que cure imediatamente a DH”. Em vez disso, ele acredita que a cura virá sob a forma de tratamentos cada vez mais eficazes, que serão desenvolvidos ao longo do tempo. Desenvolver cada um destes tratamentos específicos requer o envolvimento de uma comunidade Huntington comprometida. Sabine diz ao investigadores da DH: “Mesmo os pequenos avanços no laboratório fortalecem o nosso espírito para continuarmos”.

15:17 - Sabine, sobre as razões para se ter esperança: “A melhor parte da Humanidade está em redor da DH”.

16:18 - Roberto Weiser descreve a experiência dos doentes de Huntington na Venezuela - as famílias cujo ADN contribuiu para a descoberta do gene da DH.

16:20 - Peg Nopoulos fala no Congresso sobre o tópico da DH Juvenil, um tema que a sua equipa estuda na “University of Iowa”. Nopoulos realça que o aspecto da DH Juvenil pode ser bastante diferente dos sintomas que os doentes adultos apresentam. Nopoulos está interessada nas alterações que ocorrem muito precocemente nas pessoas portadoras da mutação da DH, mesmo durante a infância e a adolescência. Nopoulos está a estudar a estrutura cerebral de crianças de famílias Huntington, para tentar compreender se existem alterações no seu desenvolvimento precoce.

16:44 - Carlos Cosentino, um médico de Lima -Peru, que trabalha na DH, está interessado em perceber se a apresentação dos sintomas da DH varia entre os diferentes países. O primeiro artigo publicado sobre DH no Peru é de 1950. Canete, no sul do Peru, é uma região com uma incidência de DH muito acima da média. Cosentino acredita que os doentes de Huntington do Peru experienciam sintomas muito semelhantes aos dos outros doentes de outras partes do mundo. Francisco Cardoso, de Belo Horizonte - Brasil, está a falar sobre o “diagnóstico diferencial” da DH - e se for parecido com DH mas não for a doença?

17:03 - Cardoso: a maioria dos casos suspeitos de DH são confirmados como DH no teste genético, mas em cerca de 1% dos casos o teste de DH é negativo - eles não têm DH. Esses casos são denominados doenças HD-like, ou parecidas com DH. É difícil calcular a frequência destes casos HD-like, já que variam muito com a geografia e com a experiência do médico. Uma doença chamada HD-like-2 ou HDL2 é bastante comum no Brasil porque tende a afectar pessoas com antepassados africanos. Outra condição que mimetiza a DH é a chamada SCA17 (Todas estas doenças são raras, lembre-se. Geralmente, se parece ser DH, provavelmente é DH, especialmente numa família em que a DH já foi identificada).

Conclusões de fim de dia

Hoje destacaram-se os grandes progressos ocorridos na última década em termos do desenvolvimento de biomarcadores que nos ajudarão a tornar os ensaios clínicos - e, consequentemente, os fármacos - uma realidade. Ouvimos também falar sobre alguns pormenores de ensaios vindouros. Há ainda muito mais para ver no dia e meio que nos resta, portanto, mantenham-se atentos!

Os autores não têm qualquer conflito de interesses a declarar. Para mais informações sobre a nossa política de divulgação, veja a nossa FAQ...