As pessoas com doença de Huntington (DH) podem desenvolver uma série de sintomas que podem ser identificados por outras pessoas. Estes sintomas incluem movimentos musculares incontroláveis, dificuldade em engolir e dificuldade em deslocar-se. Estes sintomas são frequentemente o foco de muitos projectos de investigação porque são mais fáceis de reconhecer por outras pessoas como problemas que as pessoas com DH podem enfrentar. No entanto, o que dizer das dificuldades sociais que as pessoas com DH podem ter, que não são tão óbvias para as outras pessoas? Os cientistas estão agora a começar a investigar estes efeitos menos óbvios da DH porque há uma consciência crescente do impacto que podem ter num indivíduo e na sua qualidade de vida.

O elo perdido - uma ligação entre qualidade de vida e competências sociais?

A qualidade de vida significa simplesmente o grau de satisfação global de uma pessoa com a sua vida. A qualidade de vida pode ser considerada a partir de múltiplas abordagens. Algumas destas abordagens incluem o bem-estar físico (até que ponto uma pessoa se sente saudável), o bem-estar emocional (humor e saúde mental) e o bem-estar social (força das relações e até que ponto se sente apoiada). Pensa-se que o bem-estar físico, emocional e social são os três pilares que determinam a qualidade de vida de uma pessoa.

As pessoas com DH podem ter dificuldades com as competências sociais, causando maior dificuldade em situações sociais. Por exemplo, compreender e explicar como as outras pessoas se podem sentir em determinadas situações sociais. Para além disso, as pessoas com DH podem sentir uma maior dificuldade em compreender as emoções a partir das expressões faciais e da linguagem corporal das outras pessoas.

Investigações científicas anteriores revelaram duas descobertas interessantes sobre as pessoas com DH. Em primeiro lugar, mostraram que a qualidade de vida é reduzida nas pessoas com DH (particularmente nas fases mais avançadas da doença), em comparação com a população em geral. Em segundo lugar, algumas pessoas com DH têm mais dificuldade em lidar com situações sociais. No entanto, os cientistas ainda não tinham investigado se existia uma ligação entre estas duas ideias até recentemente, num trabalho liderado pelo Professor Hugh Rickards da Universidade de Birmingham, no Reino Unido.

Então, como é que podemos aceder ao nosso radar de satisfação com a vida?

Hugh e a sua equipa estão a estudar o que pode ligar estas duas ideias, a qualidade de vida e as dificuldades com situações sociais em pessoas com DH. Para compreender a qualidade de vida, foi dado um questionário a pessoas com DH que mede o bem-estar físico, emocional e social.

Os cientistas também fizeram perguntas às pessoas com DH sobre os sentimentos que estavam a experienciar. Algumas perguntas exploraram a frustração que as pessoas com DH podem sentir, ou o quão sobrecarregados se sentem. Estas perguntas ajudaram os cientistas a compreender as muitas emoções diferentes que as pessoas com DH podem sentir.

Os cientistas estavam particularmente interessados em saber se as pessoas com DH estavam a ter dificuldade em expressar os seus sentimentos habituais. Por exemplo, o seu amigo é um verdadeiro guloso e oferecer-lhe a sua barra de chocolate preferida fá-lo geralmente sentir-se muito feliz. No entanto, um dia dá ao seu amigo a sua barra de chocolate preferida e, estranhamente, ele não parece expressar qualquer sentimento de felicidade. Isto representa uma situação em que uma pessoa pode não estar a expressar os seus sentimentos habituais.

«A principal mensagem destas descobertas é que quando as pessoas com DH têm dificuldade em compreender situações sociais, isso pode realmente afetar a sua qualidade de vida. »

Qual é o seu QI social?: medir as competências interpessoais em pessoas com DH

Para compreender as dificuldades em situações sociais, as pessoas com DH foram convidadas a realizar diferentes tarefas. Um exemplo é a “Tarefa de Animação ”. Na Tarefa de Animação, as pessoas com DH viram desenhos animados de dois triângulos. Estes triângulos moviam-se de formas que se assemelhavam a situações sociais da vida real. Por exemplo, dois triângulos a dançar juntos, ou um triângulo a tentar “persuadir” o outro triângulo a sair de uma caixa. Depois de verem o desenho animado, as pessoas com DH tinham de explicar o que pensavam que os triângulos estavam a fazer.

A capacidade de pensar e planear actividades também pode afetar a forma como as pessoas reagem a situações sociais. Imagine um chefe de cozinha a preparar uma refeição complicada. O chefe teria de planear os ingredientes que precisa de reunir, organizar as panelas e frigideiras necessárias e controlar os seus impulsos para comer a lasanha inteira de uma só vez! Este é o exemplo perfeito das muitas competências importantes necessárias para pensar e planear actividades.

Uma questão que pode estar a perguntar-se é: como é que estas capacidades de pensamento e planeamento foram medidas em pessoas com DH? Estas capacidades foram medidas através do "Trail Making Test”. Na primeira parte deste teste, as pessoas com DH tinham de desenhar linhas entre círculos que continham um número no centro (de 1 a 25). Estas linhas tinham de ligar os círculos do número mais baixo ao número mais alto.

A segunda parte deste teste era mais complicada. Desta vez, havia círculos com letras (A-L) e círculos com números (1-12). As pessoas com DH tinham de trocar entre desenhar linhas de círculos com números, para círculos com letras. Juntavam os círculos do número mais baixo para o número mais alto e por ordem alfabética. Por exemplo, uma linha seria desenhada do círculo 1 para o círculo A e depois do círculo A para o círculo 2, e assim por diante. Esta tarefa ajudou a dar aos cientistas uma medida de quão bem as pessoas com DH conseguem pensar e planear.

Ser o Sherlock Holmes das competências sociais significa uma vida mais feliz?

Este estudo descobriu que uma qualidade de vida reduzida (especificamente, uma diminuição do bem-estar social e emocional) em pessoas com DH pode ser prevista por várias competências e comportamentos sociais. Uma competência social que previa uma redução da qualidade de vida nas pessoas com DH é a capacidade de "se colocar no lugar de outra pessoa ” para compreender os seus pensamentos e sentimentos.

Isto foi demonstrado no estudo quando as pessoas com DH, que tinham um pior bem-estar social global, eram menos capazes de explicar o que os triângulos dos desenhos animados pareciam estar a fazer (na Tarefa de Animações). Por exemplo, um triângulo parece estar a tentar persuadir ou encorajar o outro triângulo a sair de uma caixa. Quando se pediu às pessoas com DH (que tinham um bem-estar social e emocional mais baixo) para explicar o que os triângulos estavam a fazer neste vídeo, elas simplesmente descreveram que os triângulos pareciam estar a “mover-se” à volta uns dos outros.

Além disso, os resultados concluíram que uma qualidade de vida reduzida nas pessoas com DH também pode estar relacionada com o facto de terem dificuldade em expressar os seus sentimentos habituais (lembre-se do exemplo da barra de chocolate).

Respire fundo e faça um plano

Outra descoberta interessante deste estudo sugeriu que uma qualidade de vida reduzida (em termos da capacidade de uma pessoa realizar tarefas diárias no trabalho e/ou em casa), em pessoas com DH, pode estar relacionada com o facto de se sentirem sobrecarregadas ou frustradas. Esta diminuição da capacidade de realizar as actividades diárias pode também dever-se a problemas ao tentar planear as actividades (lembre-se de todas as importantes capacidades de planificação e organização de que um chefe de cozinha necessita para fazer a lasanha perfeita!)

Em conjunto, estes resultados podem sugerir que, ao melhorar estas competências sociais específicas em pessoas com DH, pode melhorar a sua qualidade de vida.

«Algumas competências sociais específicas a abordar incluem, melhorar a capacidade das pessoas para expressar os seus sentimentos, abordar as suas dificuldades de planeamento e organização, ou lidar com os seus sentimentos de frustração. »

Em poucas palavras: principais conclusões e o caminho a seguir

A principal mensagem destas descobertas é que quando as pessoas com DH têm dificuldade em compreender situações sociais, isso pode realmente afetar a sua qualidade de vida. No futuro, os cientistas devem considerar a possibilidade de explorar soluções para ajudar as pessoas com DH a melhorar as suas competências sociais.

Algumas competências sociais específicas a abordar incluem, melhorar a capacidade das pessoas para expressar os seus sentimentos, abordar as suas dificuldades de planeamento e organização, ou lidar com os seus sentimentos de frustração. Isto porque estas são as competências sociais que têm sido destacadas como importantes para determinar a qualidade de vida das pessoas com DH.

Por isso, não é necessário usar o cachimbo de cerejeira ou o chapéu de lã xadrez para procurar jóias escondidas - trabalhar estas competências sociais pode ser a própria joia para melhorar a qualidade de vida e aumentar os sentimentos de felicidade das pessoas com DH.

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