
O cérebro na doença de Huntington: maior que a soma das suas partes?
Um novo estudo importante coloca a questão: que partes do cérebro podem precisar de mais ajuda na DH?

Os sintomas da DH são causados por danos no cérebro, mas nem todas as partes do cérebro são afetadas igualmente. Isto levanta uma questão importante – se tivéssemos um tratamento que pudesse ajudar apenas uma pequena parte do cérebro, que parte escolheríamos? Um novo estudo em ratinhos de William Yang, na UCLA, tenta responder a esta questão.
Que região do cérebro causa a DH?
Os principais sintomas da doença de Huntington são familiares para a maioria dos membros de famílias com DH: declínio na capacidade de pensamento, aumento de problemas emocionais e perturbações do movimento. Os cientistas acreditam que estes problemas têm todos a sua origem no mau funcionamento e perda de células no cérebro.

Mas não em qualquer lugar do cérebro – o padrão de perda celular na DH é muito específico. Dados os cérebros de pessoas que morreram de uma série de doenças cerebrais, um médico talentoso poderia dizer-te qual morreu de DH, comparado com pacientes que morreram de doença de Alzheimer ou de Parkinson. Eles conseguem fazer isto porque, em cada caso, a doença está associada a algumas partes do cérebro serem afetadas mais proeminentemente que outras.
A parte mais vulnerável do cérebro na DH chama-se estriado. O estriado é uma estrutura relativamente pequena, profundamente por baixo da parte exterior enrugada do cérebro, que se chama córtex.
Durante o curso da DH, as células tanto no estriado como no córtex encolhem, disfuncionam e eventualmente morrem. Estudo após estudo, investigando muitas centenas de voluntários, descobriu que o estriado é o primeiro local no cérebro que encolhe em pessoas portadoras da mutação da DH.
Conectividade cerebral
De muitas formas, o cérebro é único comparado com outros órgãos no teu corpo. Uma forma como o cérebro é único é que as células que nos ajudam a pensar, chamadas neurónios, estão fortemente conectadas umas às outras. Em média, cada um dos 100 mil milhões de neurónios no cérebro está conectado a milhares de outros neurónios – dando a cada cérebro humano até 100 biliões de conexões!
As conexões no cérebro não são aleatórias: partes específicas do cérebro sabem que o seu trabalho é falar umas com as outras. Queres ter a certeza de que o nervo ótico que sai da parte de trás do teu olho está adequadamente ligado à parte do teu córtex que trata da visão, por exemplo.
Desta forma, o estriado e o córtex estão muito estreitamente conectados – de facto, o córtex envia talvez mil milhões de conexões para baixo até ao estriado. Curiosamente, as conexões não vão em ambas as direções – o estriado envia as suas próprias conexões para outro lugar no cérebro.
Estar conectado uns aos outros não é apenas como os neurónios se mantêm em comunicação uns com os outros, é na verdade como eles se mantêm vivos. Durante muitos anos os cientistas souberam que neurónios privados das suas conexões com outros neurónios vão na verdade morrer!
“Será que tratar o estriado é suficiente? A resposta, baseada nos melhores dados que temos até agora, é ‘provavelmente não’.”
Isto levanta questões interessantes na DH. Dado que tanto o córtex como o estriado parecem encolher na DH, que tecido é responsável por que sintomas particulares da DH? A perda do estriado (a parte profunda do circuito) leva à perda do córtex, ou vice-versa?
Truques de ratinho
Este tipo de questões não pode ser respondido em seres humanos, mas podemos usar ratinhos para tentar chegar ao fundo do que está a acontecer no cérebro da doença de Huntington. Uma equipa de cientistas liderada por William Yang, na UCLA, usou um tipo especial de ratinhos com DH para tentar compreender estas questões.
Os ratinhos usados por William foram geneticamente manipulados para ter um gene mutante da DH (embora ratinhos normais nunca tenham DH). A equipa de Yang deu a estes ratinhos uma peculiaridade genética especial – o seu gene mutante da DH pode ser desligado em partes específicas do cérebro, escolhidas pelos cientistas que criam os ratinhos.
Isto dá-nos a capacidade de comparar três ratinhos diferentes com DH: ratinhos ‘regulares’ com DH, com o anormal ativo por todo o cérebro; ratinhos com DH sem gene mutante da DH no seu estriado; e ratinhos com DH sem gene mutante da DH no seu córtex. Ao comparar estes grupos, podemos tentar compreender que região do cérebro é mais importante para produzir os sintomas da DH, pelo menos neste modelo de ratinho.
Descobertas
O grupo de Yang recorreu a uma série de testes usados em laboratórios para medir o comportamento de ratinhos que já se sabe estarem alterados em ratinhos com DH. Nestes testes os ratinhos com DH tiveram pior desempenho que ratinhos normais, como esperado.
Baseado no facto de que o estriado é a parte mais afetada do cérebro em pacientes com DH, poderíamos esperar que livrar-se do gene mutante da DH aqui seria do maior benefício para os ratinhos. Livrar-se do gene mutante da DH no estriado levou a alguma melhoria no comportamento dos ratinhos com DH, embora os números fossem um pouco baixos para ter certeza.

Surpreendentemente, ratinhos sem o gene mutante da DH no córtex (que é afetado mais tarde nas pessoas) pareciam estar melhor que ratinhos com DH sem o gene da DH no estriado – sugerindo que o córtex é realmente importante na DH.
Uma tendência similar foi vista quando a equipa olhou para mudanças na estrutura física do cérebro, que novamente revelou que ratinhos com DH sem gene mutante da DH no seu córtex pareciam melhor que ratinhos com DH sem um gene mutante da DH no estriado.
Finalmente, a equipa de Yang notou que para prevenir completamente os sintomas da DH, era necessário desligar o gene no córtex e no estriado.
Implicações
Este estudo sugere que a proteína mutante da doença de Huntington causa problemas tanto no córtex como no estriado – e que ambas as regiões são importantes.
Quaisquer terapias que visem apenas o estriado podem ter eficácia limitada, dados os problemas restantes noutros locais do cérebro. Esta questão não é apenas académica – certas terapias propostas para a DH, incluindo algumas formas de terapia genética e substituição de células estaminais, provavelmente visarão apenas o estriado.
Este trabalho baseia-se em truques genéticos que não são possíveis em humanos, por isso não aponta diretamente para uma terapia para pessoas. Mas usa estes truques para descobrir uma resposta a uma questão sobre a qual os cientistas da DH têm discutido durante muito tempo: “será que tratar o estriado é suficiente?” A resposta, baseada nos melhores dados que temos até agora, é “provavelmente não”.
Então porque é que estamos entusiasmados com este novo trabalho? Porque preferimos aprender estas lições em ratinhos, e usá-las para desenhar os melhores estudos possíveis em humanos com DH. Este trabalho é uma peça importante do puzzle, e esperamos que nos ajude a desenhar os melhores ensaios clínicos possíveis no futuro.
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