Chegando à raíz da Doença de Huntington: Uma abordagem baseada em plantas
Os investigadores utilizaram plantas para estudar a forma de impedir que a proteína da doença de Huntington forme aglomerados tóxicos
Escrito por Dr Rachel Harding 23 de Outubro de 2023 Editado por Dr Leora Fox Traduzido por Filipa Júlio Publicado originalmente a 15 de Outubro de 2023
Os investigadores estudaram um fragmento da proteína da Doença de Huntington (DH) em plantas e descobriram uma nova forma de a impedir de formar aglomerados tóxicos. Uma proteína vegetal especial identificada pela equipa pode prevenir a acumulação de substâncias nocivas nas plantas, bem como em alguns modelos de DH, mostrando o potencial desta abordagem como uma possível forma de tratar a DH.
Porquê estudar a DH nas plantas?
As plantas estão presas ao seu ambiente, literalmente enraizadas no solo, o que significa que não se podem mover se começarem a enfrentar condições difíceis, como demasiado sol, frio intenso ou predadores incómodos. Para ajudar a lidar com os problemas ambientais que podem enfrentar, as plantas desenvolveram todo o tipo de formas engenhosas de lidar com eles, o que as torna muito resistentes ao stress. Muitas plantas podem também viver durante muito tempo, pelo que alguns cientistas acreditam que podem ser a chave para estudar e encontrar novos medicamentos para as doenças humanas do envelhecimento.
A DH é causada por uma expansão do número de CAGs no gene da huntingtina, o que significa que é produzida uma forma expandida da proteína huntingtina. A proteína huntingtina expandida pode formar aglomerados, e os cientistas pensam que estes podem causar todo o tipo de stress nas nossas células, contribuindo para os sinais e sintomas da DH. Neste estudo, um grupo de investigadores de Colónia, na Alemanha, quis investigar se a resiliência das plantas poderia ser alargada para lidar com o stress causado por aglomerados tóxicos da proteína da DH.
As plantas que produzem a proteína da DH crescem normalmente
Primeiro, a equipa de investigação criou plantas especialmente modificadas que produzem artificialmente um fragmento da proteína da DH. Cultivaram algumas plantas que tinham uma repetição CAG muito longa que poderia ser encontrada numa pessoa com DH juvenil (69). Também cultivaram plantas para as comparar, que tinham aproximadamente o número de repetições CAG mais longo que existe em qualquer proteína de plantas, mas que à partida não causaria DH em humanos (28).
Em condições normais, descobriram que estas plantas modificadas que produziam a proteína da DH cresciam quase exatamente da mesma forma que as plantas sem a proteína da DH, e que não se formavam aglomerados de proteínas nas células das plantas. Verificaram também que a produção das proteínas da DH não desencadeava nenhum dos sistemas de resposta ao stress nas plantas. No entanto, ao submeterem estas plantas a stress adicional, como condições de calor elevado, observaram a formação de aglomerados tóxicos para ambas as formas da proteína da DH.
As proteínas da DH comunicam com o sistema de limpeza da célula no interior dos cloroplastos
Ao contrário das células humanas, as células vegetais têm compartimentos especiais chamados cloroplastos, que são responsáveis pela captação de luz para que as plantas possam produzir alimentos e crescer. No interior dos cloroplastos, encontram-se muitas peças especializadas de maquinaria celular, que mantêm os níveis de proteínas em equilíbrio e limpam as proteínas danificadas ou tóxicas, para que a energia e o crescimento se mantenham no caminho certo.
Os cientistas descobriram que estes conjuntos de maquinaria de limpeza tinham muito contacto com as proteínas da DH expandidas, e conseguiram ver este contacto acontecer tanto nos cloroplastos como noutras partes das células das plantas. Em particular, havia contacto entre a proteína da DH e uma enzima chamada SPP, que corta outras proteínas durante o processo de limpeza.
Utilizando microscópios, a equipa observou a localização da proteína da DH no interior das células das plantas. Observaram uma grande quantidade de proteína da DH em torno dos cloroplastos, o que sugere que estas estruturas especiais podem ajudar a planta a lidar com o stress da produção da proteína da DH.
Atrapalhar o trabalho do cloroplasto faz com que os aglomerados de proteína da DH se acumulem
A equipa de investigação analisou então a forma como os cloroplastos processam a proteína da DH. Nos seus estudos, verificaram que os cloroplastos eram capazes de absorver a proteína da DH enquanto esta flutuava nas proximidades, e depois removê-la.
Quiseram então ver o que aconteceria se impedissem os cloroplastos de limpar as proteínas ou de transportar as moléculas para dentro e para fora. Utilizaram diferentes químicos para desativar essas funções dos cloroplastos e, em ambos os casos, as plantas apresentaram uma acumulação de proteínas da DH e aglomerados potencialmente nocivos. Isto forneceu ainda mais provas de que os cloroplastos eram muito importantes para lidar com a proteína da DH.
Uma nova forma de diminuir a aglomeração da proteína da DH
A molécula SPP pode ajudar na limpeza de proteínas nas plantas e foi encontrada em contacto com a proteína da DH. Assim, poderá a SPP ajudar a lidar com os aglomerados de proteínas da DH noutros contextos - como em células em cultura ou num modelo animal da DH?
Na parte final do estudo, os cientistas adicionaram o gene SPP em diferentes modelos de DH para ver o que aconteceria à proteína da DH. Começaram por observar as células humanas numa placa e descobriram que o SPP impedia a acumulação de aglomerados de proteínas da DH.
Por fim, criaram minhocas microscópicas para produzir a proteína da DH, com ou sem SPP. As minhocas com SPP tinham muito menos aglomerados de proteína da DH e conseguiam mover-se melhor do que as que não a tinham.
O que é que tudo isto significa e o que se segue?
É provável que seja um longo caminho até que as pessoas com DH estejam a ser medicadas com SPP para tratar os sintomas. No entanto, a equipa de investigação por detrás deste estudo acredita que, ao investigar plantas, que podem suportar condições adversas que causam a aglomeração de proteínas, podem encontrar conhecimentos ainda mais valiosos para o tratamento de doenças humanas.
Esta abordagem baseada em plantas, inovadora e ligeiramente louca, pode ser promissora para o avanço de possíveis novos tratamentos para doenças como a DH.