Jeff CarrollEscrito por Dr Jeff Carroll Editado por Professor Ed Wild Traduzido por Filipa Júlio

Uma comunidade Huntington crescente e mais unida e um sentimento de que estamos preparados para uma nova era de ensaios clínicos na doença de Huntington foram duas mensagens proeminentes no recente Congresso Mundial sobre doença de Huntington, em Melbourne. Agora que a poeira assentou, o HDBuzz analisa os principais temas abordados no encontro.

Quebrando barreiras

Com os campos dedicados ao Oz Buzz, conseguimos mostrar-vos o Congresso Mundial sobre Doença de Huntington-2011, à medida que este decorria. Agora é o momento de olhar para trás e fazer um balanço acerca dos temas e medidas que se destacaram.

Os participantes tiveram um autêntico acolhimento de Melbourne
Os participantes tiveram um autêntico acolhimento de Melbourne

O Congresso decorreu em Melbourne, na Austrália, de 11 a 14 de Setembro. O Congresso Mundial é o maior encontro regular de cientistas, profissionais de saúde, membros de famílias Huntington, amigos e portadores da doença.

O Congresso de 2011 quebrou diversas barreiras. Em vinte anos, foi o primeiro a decorrer fora da Europa e da América. Estiveram representantes de um número de países sem precendentes. Foi o Congresso mais aberto de sempre, com os debates e assuntos científicos a serem disponibilizados para todo o mundo através do Twitter e de um vídeo online pelo Oz Buzz.

Ensaios clínicos: toca a trazê-los

Medidas exactas da doença, designadas como biomarcadores, são cruciais para testar novos tratamentos em ensaios clínicos. Houve uma nova nota de optimismo em relação ao debate acerca de biomarcadores, com vários investigadores de topo a referir que os estudos mundiais já nos deram as medidas de que necessitávamos para iniciar ensaios clínicos na doença de Huntington inicial.

A conferência iniciou-se com uma revisão de seis abordagens terapêuticas que provavelmente entrarão em ensaios nos próximos dois anos, e com a indicação de muitos mais alvos que estão a ser trabalhados em laboratório. Sarah Tabrizi anunciou a “bateria TRACK-HD”, uma selecção de medidas para ensaios na DH inicial, bem como o “TrackOn-HD”, um novo estudo das alterações no cérebro que ocorrem antes do aparecimento de sintomas na DH. A mensagem de Tabrizi - “Yes we can!” - ecoou durante o Congresso. Elizabeth Aylward e Rachael Scahill referiram estar a ter sucesso no desenvolvimento de medidas a partir de imagens de ressonância magnética que conseguem predizer e seguir sintomas - graças aos estudos TRACK-HD e PREDICT-HD.

O próximo objectivo será testar novos tratamentos em pessoas com a mutação Huntington mas sem sintomas. Joaquim Ferreira, da EHDN, salientou os desafios que se aproximam mas mostrou-se optimista em relação a estes serem ultrapassados quando os fármacos estiverem prontos para ser testados. Com pressa de enfrentar estes desafios, Nellie Georgiou-Karistianis reportou que a ressonância magnética funcional consegue identificar alterações na actividade cerebral ao longo do tempo - o que poderá ser mais sensível do que esperar que a atrofia cerebral ocorra.

E em relação aos fármacos?

Robert Pacifici, da CHDI, a maior organização fundadora e líder da investigação na DH, falou de uma nova era nos ensaios clínicos para a DH, com “um número impressionante de coisas a progredirem e a serem desenhadas para as especificidades clínicas inerentes à DH”. Mais tarde, respondendo a questões colocadas por membros da comunidade Huntington, Pacifici descreveu o processo de investigação de novos fármacos da CHDI, desde o ideal teórico à passagem dos fármacos para a etapa de ensaios clínicos: “Diariamente, temos cerca de doze lances em direcção à baliza, que estamos a tentar orientar para a terapêutica da doença”.

No Congresso, foi anunciado um ensaio de um novo tratamento potencial. O PBT2, desenvolvido pela Prana Biotech, pretende anular as interacções entre a proteína huntingtina mutada e metais, como o cobre. Isso poderá impedir que a proteína estabeleça conexões, tornando-a menos perigosa. O PTB2 demonstrou ter algum efeito na doença de Alzheimer e trabalhos preliminares com modelos de ratinhos Huntington têm sido encorajadores. Em breve, serão anunciados mais pormenores acerca deste ensaio, mas poderá ler sobre o assunto em HDBuzz.net.

Finalmente, Bernhard Landwehrmeyer, da EHDN, fez uma revisão do estudo Horizon sobre dimebon, dirigido às dificuldades cognitivas da DH (http://hdbuzz.net/26). Embora o fármaco não tenha funcionado na DH, o ensaio não deve ser considerado um fracasso: fez um bom trabalho ao endereçar a questão a que se propôs responder, e a sua fase de recrutamento e implementação foram exemplares - o que são boas notícias para futuros ensaios.

Muitas apresentações salientaram o grande número de abordagens terapêuticas que estão quase prontas para serem incluidas em ensaios clínicos com doentes.
Muitas apresentações salientaram o grande número de abordagens terapêuticas que estão quase prontas para serem incluidas em ensaios clínicos com doentes.

Desafie os seus pressupostos

Um dos temas recorrentes na ciência apresentada no Congresso foi o de desafiar os nossos pressupostos, constantemente.

Mesmo para as pessoas com a mesma extensão de CAG, os sintomas de DH poderão aparecer em diferentes idades. Jim Gusella estuda quais os factores que afectam a idade de início dos sintomas da DH. Para sua surpresa, Gusella descobriu que os modelos estatísticos previamente utilizados pelos investigadores podem ter falhas. Após corrigir essas falhas, Gusella descobriu que muitos dos genes descritos como modificadores da idade de início da DH de facto, não o são - incluindo alguns estudados pelo seu próprio grupo!

Poderá soar a um retrocesso, mas estão a decorrer estudos a nível mundial para descobrir genes modificadores da DH. As novas técnicas de análise robusta desenvolvidas por Gusella irão auxiliar-nos a encontrar verdadeiros modificadores genéticos a partir destes estudos - isto é a ciência a trabalhar da forma que deve.

Embora a DH seja claramente uma doença que afecta o cérebro, Maria Björkqvist encorajou-nos a considerar os seus efeitos fora do cérebro. Recordou que muitos doentes de Huntington acabam por falecer por causas como doença cardíaca - talvez mesmo mais do que se esperaria na ausência de DH. O trabalho da autoria de Björkqvist mostrou que os ratinhos Huntington têm problemas no processo digestivo, o que poderá contribuir para os sintomas.

A importância de se pensar fora da caixa-cérebro foi drasticamente enfatizada por Paul Muchowski. O investigador desenvolveu uma substância que, sem sequer penetrar no cérebro, mostra efeitos benéficos nos ratinhos Huntington. O estudos de Muchowski relacionam sistema imunitário - a defesa natural do nosso corpo contra a doença - e cérebro. O cérebro está basicamente fora do alcance do sistema imunitário, já que a barreira hemato-encefálica restringe cuidadosamente que químicos e células podem entrar no cérebro.

Muchowski desenvolveu uma substância, JM6, que bloqueia uma enzima chamada KMO nos glóbulos brancos, reduzindo indirectamente a produção de um químico que causa danos cerebrais. A JM6 prolongou o tempo de vida de ratinhos Huntington e Alzheimer - suportando a ideia de que tratamentos que actuam fora do cérebro poderão ajudar a protegê-lo.

Entretanto, Muchowski tem também estudado as proteínas sinalizadoras “CB2”, que só são encontradas nas células imunitárias fora do cérebro. Quando lhes foi administrada uma substância activadora da CB2, os ratinhos Huntington viveram muito mais tempo do que o habitual. A investigação de Muchowski sobre a CB2 ainda não foi publicada em nenhuma revista com arbitragem científica, mas estamos desejosos de ler sobre ela.

O mundo é um grande laboratório

A DH não está limitada a uma raça ou país: estudos mundiais mostraram que não há nenhum grupo que seja poupado. Isso sugere que a maioria dos doentes de Huntington estão fora do mundo estabelecido pela investigação científica ou pelas organizações de leigos, que é sobretudo centrado na América do Norte e na Europa Ocidental.

O Congresso Mundial reuniu investigadores dos locais mais longínquos de sempre - todos partilhando o objectivo de desenvolver tratamentos eficazes para a DH
O Congresso Mundial reuniu investigadores dos locais mais longínquos de sempre - todos partilhando o objectivo de desenvolver tratamentos eficazes para a DH

Conseguir chegar a essas comunidades foi um dos temas deste Congresso. Existe agora uma nova rede de cientistas, clínicos e famílias Huntington, na América Latina. A Red Latino-Americana de Huntington (RLAH) pretende reunir a comunidade Huntington da América Latina para ajudar a desenvolver tratamentos para a doença.

Os estudos observacionais com doentes de Huntington são uma modalidade fulcral de investigação. Estes estudos focam-se na observação de portadores da mutação Huntington e de doentes, durante um período de tempo, para compreender as alterações causadas pela mutação. Estes estudos, por sua vez, ajudam os cientistas a planear ensaios clínicos, cada um dos quais irá necessitar de centenas de voluntários se se quiser ser bem sucedido no desenvolvimento de terapêuticas.

O Enroll-HD é um novo estudo observacional mundial que pretende juntar os enormes estudos REGISTRY e COHORT que estão a decorrer, e incluir recém-chegados da América Latina, Singapura, África do Sul e Coreia do Sul. O Enroll-HD será o maior estudo da DH alguma vez feito e irá preparar o terreno para a próxima geração de ensaios clínicos na DH.

Uma nova era de comunicação

A doença de Huntington alimenta-se de silêncio e estigma. Por isso, a honestidade e a comunicação são armas poderosas na luta contra a DH.

O HDBuzz foi lançado há oito meses e Ed Wild, editor-chefe juntamente com Jeff Carroll, apresentou no Congresso um apanhado sobre o sucesso do HDBuzz - mais de 50 000 visitantes por mês, o apoio de onze associações de doentes de Huntington nacionais e regionais e tradução em nove línguas.

O Oz Buzz traduziu as notícias científicas de cada dia para linguagem simples, e as entrevistas em directo feitas a cientistas de renome aproximaram, mais do que nunca, a investigação e os membros das famílias.

Matt Ellison anunciou mais um grande avanço na divulgação - o lançamento próximo da HDYO, a Huntington’s Disease Youth Organisation. A estrear-se em Janeiro de 2012, a HDYO fornecerá informação e apoio aos jovens de todo o mundo (crianças, adolescentes e jovens adultos) que são afectados pela doença de Huntington. Os conteúdos da HDYO serão multilíngue. Para receber uma notificação por email quando a HDYO estiver activa, inscreva-se em hdyo.org.

Resumindo

Esperamos que o Oz Buzz o tenha aproximado do Congresso Mundial. Foi apresentada uma quantidade incrível de ciência e já estamos a trabalhar em vários artigos HDBuzz para lhe dar mais pormenores sobre matérias que ainda só abordámos de passagem. Os efeitos de um encontro como o Congresso Mundial serão ainda mais duradouros, com novas ideias e colaborações científicas a dar um grande impulso ao esforço mundial para descobrir tratamentos para a DH.

Os autores não têm qualquer conflito de interesses a declarar. Para mais informações sobre a nossa política de divulgação, veja a nossa FAQ...