"Buzzilia" do Congresso Mundial sobre Doença de Huntington: dia 3
#Buzzilia, dia 3: sumário de Jeff e Ed do terceiro dia do Congresso Mundial sobre DH no Rio de Janeiro
Escrito por Professor Ed Wild 18 de Outubro de 2013 Editado por Dr Jeff Carroll Traduzido por Filipa Júlio Publicado originalmente a 17 de Setembro de 2013
O nosso terceiro relatório diário do Congresso Mundial sobre Doença de Huntington no Rio de Janeiro, Brasil.
08:05 - E estamos de volta, para o terceiro dia do Congresso Mundial sobre Doença de Huntington no Rio de Janeiro.
08:07 - Jim Gusella, um dos líderes da “caça ao gene” da DH, fala ao Congresso sobre as razões pelas quais a genética ainda importa na DH. Gusella está interessado no facto de a idade em que as pessoas têm os sintomas de DH variar e parte dessa variação ser genética. O grupo de Gusella está à procura de outros factores genéticos que possam fazer com que as pessoas tenham sintomas de DH mais precocemente ou mais tarde.
08:11 - Gusella: Embora ter um gene mutado da DH cause a DH, estranhamente, o facto de se ter duas cópias desse gene não parece tornar a doença pior. Foi proposto que as variações na sequência de um determinado número de outros genes possam contribuir para o momento em que se espera que alguém comece a ter a DH. Gusella sugere que muitos destes contribuidores genéticos que foram propostos num estudo, fracassam quando se tenta replicá-los noutro estudo. Gusella está agora a analisar o genoma inteiro dos doentes de Huntington para tentar encontrar variações associadas a um início mais precoce ou mais tardio da doença. Este tipo de estudos requer milhares de amostras de ADN de doentes de Huntington. Gusella acredita que a variação na idade de início clínico da DH é um motivo de esperança, porque sugere que é possível adiar esse início.
08:29 - Gusella: Temos apenas que encontrar os genes certos!
08:30 - Lesley Jones fala à audiência sobre aquilo que os “modelos” animais de DH nos podem dizer acerca da doença. Jones salienta que há diversas alterações que foram observadas primeiro nos animais e só mais tarde nos doentes de Huntington.
08:33 - Jones: Apesar dos modelos de ratinhos Huntington serem geneticamente exactos, têm ainda que nos ajudar a desenvolver um bom fármaco para a DH. Porquê? Muitas das descobertas feitas com ratinhos não resistem quando a experiência é repetida, devido a inconsistências nos relatórios e nas experiências. Esta é uma das razões pelas quais os “grandes avanços” nos ratinhos até agora ainda não conduziram a tratamentos para a DH. Trabalhar com ratinhos é difícil e há várias variáveis de manipulação que podem modificar os resultados de uma experiência. Estamos a ficar mais eficazes na padronização da nossa abordagem à investigação animal, a fim de conseguirmos filtrar as “verdadeiras” descobertas nos modelos de DH. Jones faz parte de um grupo que está a trabalhar no sentido de comparar cuidadosamente diferentes modelos de ratinhos Huntington.
08:42 - Jones: as novas tecnologias genéticas conseguem comparar ratinhos e humanos para descobrir quais dos inúmeros modelos são mais semelhantes aos doentes de Huntington. Analisar redes de genes e actividades nos modelos animais de DH pode revelar padrões que o estudo de moléculas individuais não consegue obter. Uma forma de ver se as descobertas em animais são úteis é perceber se os doentes humanos têm diferenças genéticas nesses circuitos. Para que consigamos distinguir o sinal genético do que é ruído, precisamos de ter uma informação detalhada sobre a história familiar.
08:51 - Laura Bannach Jardim, uma cientista brasileira a estudar a DH, fala à audiência do Congresso sobre os aspectos genéticos da DH específicos na América Latina.
08:52 - Jones: Até agora, não temos sido muito bons na recolha de informação sobre a história familiar, mas isso é muito importante. Jardim lembra à audiência os antecedentes complexos dos povos da América Latina, que contêm genes europeus, nativos e africanos. Apesar de existirem quase 600 milhões de pessoas na América Latina, não temos a certeza em relação ao número exacto de pessoas afectadas pela DH. A grande ocorrência de DH na Venezuela foi notada nos anos 50, as famílias desse país contribuíram para a descoberta do gene da DH. Jardim refere que muitos outros locais no Peru e no Brasil têm uma ocorrência elevada de DH.
09:16 - Anita Goh estuda a discriminação genética em relação aos doentes de Huntington e suas famílias na “University of Melbourne”.
09:19 - Goh: vivemos numa época em que as pessoas podem ter imensa informação genética sobre si próprias, muitas vezes sem terem orientação para a compreenderem. Empresas como a 23AndMe dão aos consumidores muita informação genética, sem os ajudarem na compreensão das suas implicações. A “discriminação genética” é o tratamento diferencial ou a negação de direitos baseados na informação genética. Goh estudou a discriminação genética em portadores da mutação da DH na Austrália, como parte integrante do estudo PREDICT-HD. Cerca de um terço dos portadores da mutação da DH que responderam aos questionário de Goh referiram já terem experienciado discriminação genética. Muitas das pessoas questionadas por Goh tiveram problemas para obter um seguro de vida depois de realizarem o teste genético. Goh criou um site na internet para ajudar as famílias Huntington australianas a lidarem com a discriminação genética, chamado ‘Genetic Discrimination: Know your rights’ - Discriminação Genética: Saiba os seus direitos.
09:48 - Katharina Kubera faz um resumo de vários estudos de imagiologia cerebral que mostram alterações precoces na forma de funcionamento dos cérebros dos portadores da mutação da DH. Estas alterações parecem preceder quaisquer alterações no formato do cérebro, o que significa que os cérebros com DH poderão estar a compensar a doença durante décadas. A ideia de “compensação” foi um dos temas do Congresso Mundial sobre Doença de Huntington. Durante bastante tempo, os cérebros parecem ser muito eficazes a lidar com os danos causados pela DH.
09:57 - Michael Orth estuda as alterações psicológicas associadas à DH. Orth nota que a ressonância magnética mostra uma atrofia precoce nos portadores da mutação da DH, mas que o desempenho mental dessas pessoas se mantém normal durante bastante tempo. Orth utiliza uma técnica muito interessante chamada “estimulação magnética transcraniana” (TMS) para estudar o funcionamento cerebral na DH. A TMS permite a Orth desactivar temporariamente determinadas regiões do cérebro. Observar o cérebro a acordar é uma forma única de estudar o funcionamento cerebral na DH.
«Gusella está agora a analisar o genoma inteiro de doentes de Huntington para tentar encontrar variações associadas a um início mais precoce ou mais tardio da doença. Este tipo de estudos requer milhares de amostras de ADN de doentes de Huntington. »
10:16 - Tiago Mestre, de Toronto, está interessado nas alterações no líquido que envolve o cérebro - o líquido cefalorraquidiano (LCR) - nos doentes de Huntington. Embora o LCR seja colhido na medula espinhal, banha directamente o cérebro, portanto é um bom alvo para procurar alterações precoces na DH. O objectivo de Mestre é o de encontrar diferenças no LCR dos doentes de Huntington, na esperança de que estas alterações possam ser corrigidas com um ensaio clínico. Mestre sugere que na doença de Alzheimer se observam alterações muito específicas no LCR. Na DH, não estamos ainda nesse ponto. Felizmente, podemos aprender com a experiência de outras doenças, como a doença de Alzheimer.
10:35 - Cristina Sampaio é a Directora Clínica da “CHDI Foundation”, trabalhando no desenvolvimento e teste de novas terapias para a DH. Sampaio interessa-se pelos “biomarcadores” da DH. A CHDI tem uma equipa a trabalhar no desenvolvimento de biomarcadores para a DH.
13:24 - Na sessão para “familiares”, Ignacio Munoz-Sanjuan está a falar sobre o ‘Factor_H’. O projecto FactorH pretende melhorar a qualidade de vida das pessoas afectadas pela doença de Huntington na América Latina. O FactorH é um projecto não-lucrativo e não está filiado em qualquer instituição científica ou de outro tipo existente.
13:27 - Munoz-Sanjuan: O FactorH pretende desenvolver projectos específicos, estabelecer parcerias com organizações não-governamentais, aumentar a sensibilização para a doença e mobilizar as comunidades locais. O FactorH está a trabalhar com a organização “Habitat for Humanity” para recrutar e orientar a ajuda tão necessária às famílias latino-americanas afectadas pela DH.
14:15 - A próxima sessão é importante - é sobre o teste genético na DH e as actualizações em torno do teste “preditivo”. O teste preditivo diz respeito a alguém que está em situação de risco de DH e realiza um teste genético para saber se tem a mutação que causa a DH. Se a mutação estiver presente, significa que a pessoa irá desenvolver sintomas de DH a partir de dado momento no futuro. A decisão de fazer o teste é uma decisão difícil e uma decisão pessoal, sem uma resposta certa ou errada. O aconselhamento genético especializado é essencial para assegurar que a pessoa está completamente informada e teve tempo suficiente para pensar nas coisas com cuidado. As directrizes internacionais aprovadas existem para garantir que o aconselhamento genético é fiável, detalhado e prestado por especialistas.
14:20 - Rhona Macleod dá-nos actualizações sobre as directrizes existentes.
14:22 - Macleod: Uma zona confusa é aquela zona cinzenta entre um teste claramente positivo e um teste claramente negativo. Os resultados nesta zona cinzenta são raros e as investigações recentes podem ajudar-nos a compreendê-los. Não se realizam testes preditivos a crianças porque se está a retirar-lhes o direito de escolherem por elas próprias. Isto é controverso! As directrizes, escritas em 1994, podem precisar de ser revistas à luz da experiência e das novas evidências científicas. A “World Federation for Neurology” e a “International Huntington Association” (IHA) estão a fazer a revisão dessas directrizes. Não há ainda alterações definitivas e quaisquer actualizações terão que ser aprovadas pela comunidade Huntington.
14:42 - Representando a IHA, Asun Martinez sugere que as directrizes têm que ser revistas e melhor monitorizadas, para garantir que são seguidas.
14:48 - Claudia Perandones (Argentina) nota que, na maior parte da América Latina, o teste genético não está disponível ou é feito sem o aconselhamento adequado.
14:56 - Ouvimos o testemunho de um membro de uma família brasileira que disse que 40 pessoas de uma família fizeram o teste num laboratório privado e que todos os resultados foram enviados para uma só pessoa. Foi desastroso - é este tipo de coisas que as directrizes pretendem prevenir.
15:19 - Um debate útil entre especialistas e membros de famílias. Parece haver um sentimento geral de que as directrizes devem ser revistas e se deve assegurar que são seguidas.
16:27 - A sessão final de hoje é sobre o estudo ENROLL-HD.
16:28 - O ENROLL-HD é um estudo observacional mundial sobre DH, que pretende registar o maior número de pessoas possível. O ENROLL pretende ajudar-nos a compreender a DH e também a acelerar o recrutamento para ensaios clínicos futuros, para que os fármacos possam vir a ser testados mais rapidamente. O ENROLL irá permitir que investigadores da DH qualificados acedam com segurança a informação sobre portadores da mutação da DH, para que se possa acelerar a investigação.
16:32 - Monica Haddad, uma neurologista brasileira, debate a forma como a partilha de informação sobre doentes pode providenciar melhores cuidados aos doentes de Huntington. Haddad realça que a qualidade dos cuidados prestados aos doentes de Huntington varia imenso de país para país. Haddad espera que o que se aprender com o ENROLL possa informar os médicos de todo o mundo acerca dos melhores métodos de cuidados para a DH.
16:42 - Claudia Perandones, uma médica argentina que estuda a DH, descreve “aglomerados” de doentes de Huntington por toda a América Latina. As numerosas famílias Huntington da América Latina já nos ensinaram muito acerca da genética da DH; Perandones sugere que ainda podemos aprender mais.
Conclusões de fim de dia
Hoje a audiência ouviu comunicações de investigadores internacionais da DH já conhecidos e também de vários cientistas anfitriões da América Latina. Fomos relembrados pelos investigadores que estudam a DH em humanos sobre o quão importante é o envolvimento das famílias na investigação científica. Foram apresentados os resultados de estudos genéticos que envolveram mais de 3000 doentes de Huntington voluntários, bem como os resultados do TRACK-HD, que implicou o estudo intensivo de 300 voluntários ao longo de 3 anos. As famílias e as organizações de doentes mantêm-se envolvidas e motivadas, tal como vimos no debate da tarde sobre as directrizes do teste genético preditivo. É já claro que estamos no caminho para desenvolver tratamentos para a DH, mas o envolvimento activo de toda a comunidade Huntington global é uma parte essencial do nosso sucesso até aqui.